domingo, 17 de agosto de 2025

A Mulher Vestida de Sol e o Mundo em Guerra: Uma Crônica da Assunção (Diác. Edson Araújo)

"Então apareceu no céu um grande sinal: uma Mulher vestida de sol, tendo a lua debaixo dos pés e sobre a cabeça uma coroa de doze estrelas." (Ap 12,1)

Neste 17 de agosto de 2025, enquanto a Igreja Católica no Brasil celebra solenemente a Assunção da Virgem Maria ao Céu, o mundo se encontra mergulhado no que os historiadores já chamam de "o ano com mais guerras desde o fim da Segunda Guerra Mundial". São 56 conflitos armados ativos, o dobro dos registrados em 1996, numa escalada de violência que deveria nos fazer refletir sobre o contraste radical entre a imagem bíblica da "Mulher vestida de sol" e a realidade sombria de um planeta dilacerado pela guerra.

A liturgia de hoje nos apresenta uma visão apocalíptica que ecoa de forma inquietante através dos noticiários contemporâneos: "Então apareceu outro sinal no céu: um grande Dragão, cor de fogo. Tinha sete cabeças e dez chifres e, sobre as cabeças, sete coroas. Com a cauda, varria a terça parte das estrelas, atirando-as sobre a terra."

O Dragão da Guerra e a Mulher da Paz

Enquanto Putin e Trump se encontram para conversarem sobre a guerra da Ucrânia, sem chegar a acordos concretos para um cessar-fogo com a Rússia que controla militarmente, cerca de 20% do território ucraniano, em Gaza, pelo menos 1.760 palestinos já foram mortos desde o final de maio; a maioria buscando ajuda humanitária, assim, o simbolismo do Apocalipse ganha contornos dramáticos de realidade.

O Dragão apocalíptico, com sua fúria destruidora, parece materializar-se nas decisões políticas que privilegiam a força sobre o diálogo, a conquista territorial sobre a dignidade humana, os interesses geopolíticos sobre a vida dos inocentes. Como nas visões de São João, o Dragão "parou diante da Mulher, que estava para dar à luz, pronto para devorar o seu Filho, logo que nascesse."

Maria, a Mulher vestida de sol, representa precisamente o oposto desta lógica. No Magnificat proclamado na Visitação a Isabel, ela anuncia uma revolução silenciosa, mas radical: "Ele mostrou a força de seu braço: dispersou os soberbos de coração. Derrubou do trono os poderosos e elevou os humildes. Encheu de bens os famintos, e despediu os ricos de mãos vazias."

A Revolução Mariana e a Política Mundial

A mensagem da Assunção não é uma fuga mística da realidade terrena, mas uma proposta concreta de transformação social. Maria, assumpta ao céu em corpo e alma, não abandona a Terra - ela se torna intercessora universal por uma humanidade que parece ter perdido o rumo da fraternidade.

O Papa Francisco, em várias ocasiões, confiou a Maria as dores das populações dos países em guerra, e seus apelos ecoam até hoje como um contraponto necessário à lógica da violência que domina as manchetes mundiais. "Não devemos resignar-nos à lógica do conflito e das armas", pedia o Santo Padre, propondo Maria como modelo de uma diplomacia baseada na humildade, no serviço e no reconhecimento da dignidade do outro.

Mas o que significaria, concretamente, aplicar o "método mariano" às relações internacionais contemporâneas?

O Exemplo de Maria: Ver o Outro como Igual

Na Visitação, Maria não chega à casa de Isabel como conquistadora, mas como servidora. "Maria partiu para a região montanhosa, dirigindo-se, apressadamente, a uma cidade da Judeia." Seu movimento é de aproximação, não de dominação. Sua primeira palavra é de saudação, não de imposição.

Imagine se os líderes mundiais adotassem esta postura mariana nas negociações internacionais. Ao invés de chegarem às mesas de negociação com exigências irrevogáveis e ameaças veladas, que chegassem com a humildade de quem reconhece no outro um irmão em humanidade.

Quando Maria visita Isabel, ambas se beneficiam do encontro: Isabel é consolada na sua gravidez, e Maria encontra confirmação de sua missão. É o modelo perfeito da diplomacia ganha-ganha, onde a paz não é uma vitória de uns sobre outros, mas uma vitória compartilhada da humanidade sobre a barbárie.

A Urgência do Momento Presente

Os dados são alarmantes: além dos conflitos na Ucrânia e em Gaza, há conflitos armados ativos concentrados principalmente na África (17) e na Ásia, muitos dos quais passam despercebidos pela opinião pública mundial. São milhões de pessoas vivendo sob o terror das armas enquanto o mundo parece cada vez mais dividido entre blocos antagônicos.

A resposta de Maria ao anjo "Faça-se em mim segundo a tua palavra" representa a antítese da atitude dos líderes que insistem em impor sua vontade pela força. Maria aceita um plano que não compreende completamente, mas confia na bondade fundamental do projeto divino para a humanidade.

Que revolução política seria possível se os governantes mundiais adotassem esta postura de abertura ao bem comum, mesmo quando isso contraria seus interesses imediatos? Se, ao invés de "fazer-se segundo minha vontade", optassem por "fazer-se segundo o bem da humanidade"?

O Magnificat Como Programa Político

"A minha alma engrandece o Senhor", canta Maria, e esta é precisamente a atitude que falta no cenário político internacional: a capacidade de engrandecer algo maior que os próprios interesses nacionais, étnicos ou religiosos.

O Magnificat é, na verdade, um dos textos mais revolucionários da história. Quando Maria canta que Deus "derrubou do trono os poderosos e elevou os humildes", ela está anunciando que a verdadeira ordem do mundo não é aquela baseada na força militar ou no poder econômico, mas na justiça e na misericórdia.

Aplicado às crises atuais, isso significaria que a solução para o conflito russo-ucraniano não está na capacidade de um lado impor militarmente sua vontade ao outro, mas na construção de uma paz justa que reconheça a dignidade e os direitos legítimos de ambos os povos. Da mesma forma, a questão palestino-israelense não se resolverá enquanto uma das partes tentar aniquilar ou subjugar a outra, mas apenas quando ambas reconhecerem o direito mútuo à existência e à dignidade.

A Assunção Como Esperança Política

A Assunção de Maria não é apenas um privilégio concedido à Mãe de Jesus, mas um sinal de esperança para toda a humanidade. Ela prefigura o destino último de todos aqueles que escolhem o caminho do amor ao invés do caminho da violência.

Politicamente, isso significa que as nações e líderes que optarem pela via mariana - humildade, serviço, reconhecimento da dignidade do outro, preferência pelos pobres e marginalizados - estarão alinhados com o sentido último da história humana.

O contrário também é verdadeiro: aqueles que insistem na lógica do Dragão apocalíptico - dominação, violência, desprezo pelos fracos - estão condenados ao fracasso histórico, mesmo que momentaneamente pareçam triunfar.

Um Apelo Urgente aos Líderes Mundiais

Neste dia em que celebramos a Assunção de Maria ao céu, é impossível não dirigir um apelo urgente aos líderes mundiais: olhem para o exemplo da Virgem Maria como modelo de liderança autêntica.

A verdadeira grandeza não está em dominar territórios ou subjugar povos, mas em servir à vida e à dignidade humana. A verdadeira vitória não é derrotar militarmente o adversário, mas construir uma paz que permita a todos viverem com dignidade.

Como disse o Papa Francisco em certa ocasião, "precisamos de paz neste tempo de guerra mundial". E essa paz só virá quando os líderes aprenderem a ver no outro não um inimigo a ser destruído, mas um irmão a ser acolhido.

A Mulher Vestida de Sol em Tempos Sombrios

A imagem de Maria, Mulher vestida de sol, com a lua debaixo dos pés e uma coroa de doze estrelas, não é uma fantasia poética, mas uma visão profética do que a humanidade pode se tornar quando escolhe o caminho da fraternidade.

Em tempos em que o mundo registra o maior número de conflitos armados desde a Segunda Guerra Mundial, a Assunção de Nossa Senhora surge como um lembrete urgente de que existe uma alternativa à lógica da violência.

Esta alternativa não é utópica - ela foi vivida concretamente por uma jovem mulher de Nazaré que soube dizer "sim" a um projeto maior que ela mesma, que soube servir ao invés de dominar, que soube ver em cada pessoa um reflexo da dignidade divina.

Se os líderes mundiais conseguirem enxergar o outro como Maria enxergava - não como ameaça, mas como promessa; não como rival, mas como irmão; não como obstáculo, mas como colaborador na construção de um mundo mais justo -, então será possível transformar este "ano com mais guerras" no início de uma era de paz duradoura.

A Mulher vestida de sol continua a interceder pela humanidade. Cabe a nós, especialmente àqueles que exercem poder político, decidir se queremos seguir seu exemplo de humildade e serviço, ou se continuaremos alimentando o Dragão da guerra com nossa sede insaciável de dominação.

"Agora realizou-se a salvação, a força e a realeza do nosso Deus", proclama a liturgia de hoje. Que esta salvação se manifeste também na política internacional, por meio de líderes que tenham a coragem de seguir o exemplo mariano de colocar o bem da humanidade acima dos interesses particulares.

A paz mundial não é um sonho impossível, mas uma exigência moral para todos aqueles que reconhecem em Maria Santíssima o modelo perfeito de como a humanidade pode viver em harmonia, justiça e fraternidade.

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