sábado, 27 de setembro de 2025

A vida feliz (Dom João S Cardoso)


A busca da felicidade é inerente ao ser humano. Todos desejamos ser felizes e realizar-nos plenamente. Mas, afinal, o que é a vida feliz? Como alcançá-la? Esses questionamentos acompanham a humanidade desde os primórdios, e cada geração, em seus contextos culturais e históricos, levanta tais questões. Para muitos, a felicidade identifica-se com o prazer; para outros, com o poder, o prestígio ou a riqueza. O dinheiro não gera, por vezes, a ilusão de que tudo pode ser comprado e de que todos os problemas podem ser resolvidos? Em nossos dias, celebridades e influenciadores digitais são frequentemente apresentados como modelos de sucesso, impondo a ideia de que a felicidade se mede pelo número de seguidores e pela visibilidade social. Contudo, essa questão, longe de ser apenas contemporânea, já foi objeto de reflexão na Antiguidade e encontrou em Santo Agostinho uma das respostas mais fecundas e atuais.

O tema da felicidade despertou em Agostinho ainda jovem, quando leu o Hortênsio, de Cícero. Essa obra introduziu-o na filosofia como arte de viver e busca da sabedoria. Cícero, ao examinar as escolas filosóficas, apresentava a filosofia como caminho para a vida boa e feliz. Agostinho, impactado, passou a acreditar que ela poderia oferecer a felicidade plena que tanto desejava. Esse impulso amadureceu no retiro de Cassicíaco, onde, em diálogo com seus amigos e sua mãe, Mônica, escreveu o tratado A Vida Feliz (De beata vita). Num ambiente festivo, celebrando seu aniversário, lançou-se à investigação: o que é, afinal, a felicidade?

Ao longo do diálogo, Agostinho revisa concepções comuns: riquezas, prazeres, honras, poder. Todas se revelam insuficientes porque são bens frágeis, finitos e perecíveis, sujeitos ao tempo e à transitoriedade. Quem deposita neles a sua alegria não possui estabilidade, pois o menor revés — a perda de dinheiro, a doença ou a queda do prestígio — arruína a vida. Uma felicidade fundada no transitório não pode ser verdadeira.

Para Agostinho, a verdadeira felicidade consiste em possuir o bem supremo, que é Deus. A vida feliz não se identifica com os bens externos, mas com a posse interior do Absoluto. Felicidade é conhecimento e amor de Deus, alcançado pela sabedoria que ele mesmo comunica. Ao contrário das promessas enganosas do mundo, esse bem é eterno e imutável. Por isso, “ninguém pode ser feliz se não possuir a Deus”.

Dessa forma, Agostinho retoma uma convicção profundamente cristã: Deus é o único que satisfaz plenamente o coração humano. Os bens terrenos podem oferecer conforto, bem-estar e alegrias passageiras, mas somente em Deus o desejo encontra repouso. A felicidade não resulta de uma sensação fugaz, mas de um enraizamento naquilo que permanece para sempre.

A mensagem de Agostinho é surpreendentemente atual. Num mundo marcado pelo hedonismo, pelo consumismo e pelo secularismo, falar de Deus como condição da felicidade parece um desafio. Contudo, a experiência contemporânea confirma sua lucidez: quanto mais a sociedade fundamenta a felicidade em aparências e coisas externas que rapidamente perecem, mais cresce a sensação de vazio e insatisfação. Agostinho mostra que a felicidade não resulta da acumulação, da visibilidade ou do poder, mas da interioridade, da sabedoria e do encontro com Deus. Esse ensinamento dialoga com o anseio do ser humano moderno, cansado de ilusões e sedento de sentido.

A vida feliz, para Agostinho, é dom e graça: nasce da relação com Deus, bem supremo, fonte de verdade e de amor. O filósofo e bispo de Hipona ensina que a verdadeira alegria não pode ser comprada nem conquistada pela vaidade, mas acolhida como participação na eternidade divina. Seu ensinamento é uma resposta perene ao enigma da felicidade: “Fizeste-nos para Ti, Senhor, e inquieto está o nosso coração enquanto não repousa em Ti” (Confissões, I,1).

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