domingo, 9 de novembro de 2025

Dedicação da Basílica e Dedicação ao Planeta (Diác. Edson Araújo)

Uma crônica sobre a COP30 à luz das Escrituras

Neste domingo, 9 de novembro de 2025, enquanto a Igreja celebra a Dedicação da Basílica do Latrão, a mãe e cabeça de todas as igrejas, o Brasil se prepara para receber, 50 mil pessoas vindas de 143 nações para a COP30, em Belém. Não é mera coincidência do calendário. É um sinal profético que nos convida a ler os acontecimentos políticos com os olhos da fé.

O rio que cura as águas mortas

O profeta Ezequiel viu águas brotando do templo. Primeiro, um filete aos tornozelos; depois, um rio aos joelhos; logo, águas que chegavam à cintura; e, enfim, um rio caudaloso, impossível de atravessar a pé (Ez 47,1-2.8-9.12). Essa água transformava o Mar Morto, símbolo da esterilidade, em fonte de vida. “Onde chegar esse rio, todos os seres vivos que nele fervilham poderão viver”, profetizou Ezequiel.

Na segunda-feira, quando os líderes mundiais se reunirem às margens do rio Amazonas, em Belém, estarão ali justamente porque as águas do planeta estão morrendo. Os oceanos acidificados, os rios poluídos, as geleiras derretidas, as secas prolongadas, nosso “Mar Morto” contemporâneo é a Terra sufocada pelos gases de efeito estufa, o planeta aquecido em 1,5°C rumo ao colapso climático.

A COP30 não é apenas mais uma conferência diplomática. É, ou deveria ser, o templo de onde brota a água que cura. O desafio está posto desde a Rio-92: estabilizar a concentração de gases na atmosfera. Trinta anos depois, ainda tateamos às margens da solução. Como nas águas de Ezequiel, começamos devagar, acordos tímidos, aos tornozelos. Mas a crise climática nos obriga a ir mais fundo.

O zelo pela Casa Comum

“O zelo por tua casa me consumirá”, clamaram os discípulos ao verem Jesus expulsar os vendilhões do templo (Jo 2,13-22). Cristo purificou a casa de Deus porque ela havia se tornado mercado, lugar de comércio e não de oração. Que imagem mais perfeita para descrever o drama ecológico atual, não?

Nossa Casa Comum, expressão consagrada pelo Papa Francisco na Laudato Si’, virou mercadoria. Florestas são derrubadas pelo lucro imediato. O Ártico é cobiçado por suas reservas minerais expostas pelo degelo. Povos indígenas são expulsos de suas terras ancestrais para dar lugar ao agronegócio predatório. Nossas águas, nosso ar, nossa biodiversidade: tudo no balcão, tudo à venda.

A COP30 em Belém, no coração da Amazônia, nos convoca a expulsar os mercadores do templo planetário. Mas a pergunta que fica é: teremos o zelo de Cristo? Ou faremos da conferência mais um mercado de créditos de carbono sem compromisso real com a transformação?

O embaixador André Lago, presidente da COP30, reconhece: “É um processo que vai exigindo constantes aperfeiçoamentos.” Traduzindo: avançamos devagar demais. Stela Herschmann, do Observatório do Clima, é ainda mais direta: “As COPs têm um processo de tomada de decisão muito lento e a gente não tá correspondendo à velocidade da mudança.”

Somos templos, não mercados

São Paulo nos lembra: “Vós sois o templo de Deus e o Espírito de Deus habita em vós” (1Cor 3,16-17). Se nossos corpos são templos, quanto mais a Terra, essa catedral viva, respirante, fervilhante de vida, que abriga bilhões de criaturas, né verdade?

A liturgia de hoje não celebra apenas pedras e paredes da Basílica do Latrão. Celebra a Igreja como comunidade viva, construída sobre Cristo, a pedra angular. Da mesma forma, a COP30 não deveria celebrar apenas acordos e documentos. Deveria celebrar, e reconstruir, a comunidade de nações sobre o alicerce da justiça climática.

Jesus falou em “destruir o templo e reconstruí-lo em três dias” (Jo 2,19). Os judeus não entenderam: Ele falava de Seu próprio corpo, que ressuscitaria. Nós também precisamos entender: o planeta está sendo destruído, mas ainda há tempo para a ressurreição. Não em três dias, mas nos três anos que restam para reverter o aumento de 1,5°C. O templo pode ser reconstruído, mas só se agirmos já.

Da Basílica ao Parque da Cidade

A Basílica de Latrão foi destruída e reconstruída várias vezes ao longo dos séculos. Em 1724, o Papa Bento XIII estendeu sua celebração a toda a cristandade, simbolizando a unidade da Igreja com Pedro. Hoje, a unidade necessária é de outra ordem: é a unidade das nações em torno da sobrevivência comum.

O Parque da Cidade de Belém, principal sede da COP30, será temporariamente o “Latrão climático”, não a catedral de uma religião, mas o altar onde a humanidade deve apresentar sua oferenda: compromisso real com o planeta. A “zona azul” será o santo dos santos, onde chefes de Estado negociam os rumos da política climática. A “zona verde” será o átrio dos gentios, onde a sociedade civil, os povos originários, os cientistas, os verdadeiros profetas do nosso tempo, clamam por justiça.

Os braços do rio trazem alegria

“Os braços de um rio vêm trazer alegria à cidade de Deus”, canta o Salmo 45(46). Belém está às margens do rio que é coração da Amazônia. Se de fato a COP30 permitir que dali brotem águas vivas, financiamento climático real, transição energética justa, proteção dos biomas, respeito aos povos da floresta, então sim haverá alegria.

Mas se a conferência produzir apenas declarações vazias e metas adiadas, teremos perdido mais uma oportunidade. E o Mar Morto continuará morto.

Enquanto celebramos a Dedicação do Latrão, rezemos pela dedicação dos líderes que chegarão a Belém. Que tenham o zelo de Cristo. Que vejam as águas de Ezequiel brotando da floresta. Que percebam: somos todos templos do Espírito, e a Terra é o templo que nos abriga.

Que da COP30 brote um rio. Um rio que chegue aos joelhos, à cintura, que se torne intransponível de tão caudaloso. Um rio que cure as águas mortas do planeta e faça germinar árvores cujas folhas sejam remédio para os povos.

Porque se não formos capazes de dedicar o templo da Criação ao seu Criador, de nada adiantará dedicar basílicas e catedrais. Como disse São Paulo: se destruirmos o templo de Deus, Deus nos destruirá (1Cor 3, 17). Mas se o reconstruirmos sobre Cristo, a pedra angular da justiça, da misericórdia e do cuidado com toda a Criação, então haverá esperança.

A partir desta segunda-feira, Belém será o centro do mundo. Que seja também o centro da conversão ecológica que o planeta tanto precisa.


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