Por Diego López Colín
A Conferência Episcopal da Costa Rica (CECOR, na sigla em espanhol) se manifestou contra uma iniciativa legislativa que propõe obrigar os padres a “revelar as informações confiadas por um penitente” em casos de crimes sexuais contra menores de idade e pessoas com deficiência.
O projeto foi apresentado pelo deputado Antonio Ortega Gutiérrez, chefe do partido Frente Ampla – partido político que se identifica doutrinariamente como de esquerda, progressista e feminista, entre outros princípios – e membro da comissão especial permanente de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa da Costa Rica.
O que diz a proposta?
A proposta fala sobre acrescentar uma subseção ao artigo 106 do código de processo penal da Costa Rica para que qualquer pessoa com cargo clerical ou de poder que tenha "facilitado a preparação, tentativa, consumação ou ocultação do ato ilícito" responda financeiramente à vítima.
A proposta também busca modificar o artigo 206. Se for aprovado, o artigo vai reconhecer que os ministros religiosos, pessoal médico, advogados, notários, funcionários públicos, entre outros, podem “abster-se de testemunhar sobre fatos secretos que tenham chegado ao seu conhecimento”. No entanto, o projeto diz que essas pessoas não podem “negar o seu depoimento quando forem dispensadas pelo interessado do dever de guardar sigilo”.
Isso permitiria, com o consentimento da vítima, convocar a pessoa a quem foi confiado o segredo, que poderia ser um padre.
O projeto também exigiria que qualquer pessoa que tivesse “sinais identificados de crimes sexuais” em detrimento de menores ou pessoas com deficiência apresentasse uma queixa às autoridades “imediatamente”.
“Ataque direto à doutrina e à liturgia”
Diante dessa proposta, a CECOR emitiu um comunicado na quarta-feira (30) no qual diz que o projeto constitui “um ataque direto à Doutrina e à Liturgia da Igreja Católica sobre o tema do Sacramento da Penitência ou da Confissão”.
O cânon 983 do Código de Direito Canônico, a lei da Igreja, diz que “o sigilo sacramental” ou segredo de confissão é inviolável. O cânon diz ser estritamente proibido o confessor “denunciar o penitente nem por palavras nem por qualquer outro modo nem por causa alguma”.
O cânon 1386 diz que qualquer confessor que violar esse selo incorre em excomunhão latae sententiae [automática] reservada à Sé Apostólica.
A conferência episcopal diz que essa lei obrigaria os sacerdotes a “revelar a informação confiada por um penitente, seja vítima, autor ou testemunha de um ato dessa natureza”, afetando inclusive os casos em que “a sua única fonte de informação está dentro do sacramento da confissão”.
A CECOR descreveu essa iniciativa como uma “tentativa de alguns legisladores de interferir na doutrina e na liturgia da Igreja, desrespeitando a sacralidade daquele momento em que o penitente está diante de Deus e da sua consciência”.
A conferência episcopal pediu “aos católicos para que defendam a nossa fé e o respeito pela liberdade religiosa dos católicos na Costa Rica” e para que invoquem uma oração ao Espírito Santo para “iluminar os nossos legisladores e governantes para cumprirem a sua missão de sempre buscar o Bem Comum”.
“Um direito fundamental” está ameaçado
Os padres Mauricio Granados e Ricardo Cerdas, como representantes da CECOR, se reuniram com membros da comissão especial permanente de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa da Costa Rica na quinta-feira (31) para expressar a posição da Igreja.
Depois dessa reunião, o deputado Ortega Gutiérrez fez um pedido de retificação à conferência episcopal, que diz que “rejeitamos categoricamente a manipulação, a desinformação e a falta de compromisso dos bispos na luta contra a violência sexual”.
Sobre o pedido de retificação, a assessoria de comunicação da CECOR divulgou um documento na sexta-feira (1) para falar sobre alguns pontos “que foram distorcidos nesse debate público”.
O documento diz que a Igreja “tem um compromisso inabalável com a proteção das crianças e das pessoas mais vulneráveis, e em nenhum momento buscou obstruir a justiça ou encobrir crimes de violência sexual”.
A CECOR diz que o “sigilo sacramental” é uma obrigação dos sacerdotes da Igreja, que não se trata de “proteger quem comete crimes, mas sim de preservar o caráter sagrado da confissão como espaço seguro de arrependimento e acompanhamento espiritual”.
“É incorreto e enganoso dizer que os bispos ou a conferência episcopal se opõem à justiça ou à proteção de menores”, diz o comunicado, ao mesmo tempo que diz que a CECOR tem colaborado com as autoridades na implementação de políticas de prevenção e denúncia de casos de abuso.
“Esse projeto de lei, ao tentar levantar o selo sacramental, não só ameaça um direito fundamental da prática religiosa, mas também compromete a própria essência da liberdade de culto”, diz o comunicado.
Por fim, foi feito um apelo ao diálogo e a soluções conjuntas “que garantam a proteção das vítimas sem violar a liberdade religiosa ou a integridade do sacramento da confissão”.
O projeto vai continuar a ser analisado e discutido na comissão permanente especial de Direitos Humanos. Caso seja aprovado nessa instância, o projeto será debatido no plenário da assembleia legislativa do país.