Por Diác. Eduardo Wandeley
As famílias por esse Brasil afora estão vivendo as perspectivas de bons resultados dos seus filhos, netos, sobrinhos, primos, amigos que estão se submetendo ao Exame Nacional do Ensino Médio - ENEM. Mais de cinco milhões de participantes nesse ano. 180 questões mais a redação distribuídas em dois domingos sucessivos. Missas, bênçãos e, por que não dizer, fazendo parte de nossa cultura religiosa, muitas promessas. Vagas muito disputadas exigem o melhor desempenho possível. E para a vida eterna, será que teremos um exame assim?
A constituição Lumen Gentium, Luz dos Povos, do Concílio Vaticano II, trata da necessidade de se viver em Igreja. Não é uma questão de ir para os sacramentos. É isso e ainda mais. O nº 14 diz assim: “São plenamente incorporados à sociedade que é a Igreja aqueles que, tendo o Espírito de Cristo, aceitam toda a sua organização e os meios de salvação nela instituídos, e que, pelos laços da profissão da fé, dos sacramentos, do governo eclesiástico e da comunhão, se unem, na sua estrutura visível, com Cristo, que a governa por meio do Sumo Pontífice e dos Bispos. Não se salva, porém, embora incorporado à Igreja, quem não persevera na caridade: permanecendo na Igreja pelo ‘corpo’, não está nela com o coração. Lembrem-se, porém, todos os filhos da Igreja que a sua sublime condição não é devida aos méritos pessoais, mas sim à especial graça de Cristo; se a ela não corresponderem com os pensamentos, palavras e ações, bem longe de se salvarem, serão antes mais severamente julgados”. É preciso uma incorporação plena à Igreja. Ser e viver Igreja.
O exercício de entendermos a salvação como um dom de Deus e não como uma prova social é muito sensível. Nossa condição humana nos faz pensar num exame como o ENEM e com a competitividade reinante em nossa sociedade atual, muitos correm o risco de ficar de fora por estar em lugar mais distante, com “desempenho inferior”. Mas é importante invocarmos Mt 20, 1-16, na parábola dos trabalhadores na vinha. O patrão saiu para contratar trabalhadores ainda de madrugada, mas fez o mesmo, às nove horas, ao meio-dia, às três da tarde e, por último, às cinco. Todos receberam a mesma recompensa.
Na estrada da vida estamos todos, todos mesmo, no caminho. Alguns começaram a seguir Jesus ainda crianças, incentivados por suas famílias. Outros, como o “bom ladrão” só fizeram sua profissão de fé no fim da vida. Mas todos recebem a mesma recompensa. Podemos achar, por causa da lógica humana, uma injustiça, assim como os trabalhadores que passaram o dia na vinha e reclamaram um tratamento diferenciado. Mas é libertador não entrarmos em disputas, em tentativas de ser melhor que os outros. Mesmo os apóstolos caíram nessa armadilha. Tiago e João, na narrativa de Marcos (10, 35-45), pediram para ficar em destaque junto a Jesus. O mestre os repreendeu e disse: “Não será assim entre vocês. Ao contrário, quem quiser tornar-se importante entre vocês deverá ser servo”. E ainda completou “Pois nem mesmo o Filho do homem veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate por muitos”.
Mas isso tudo não significa que não devemos ter uma regra de comportamento que devamos seguir. Não para nos tornar meritosos, mas por causa de um grande amor. O Papa Francisco, em sua exortação sobre a santidade nos dias atuais, Gaudete et Exultate, nos lembra no número 95: “No capítulo 25 do Evangelho de Mateus (vv. 31-46), Jesus volta a deter-se numa destas bem-aventuranças: a que declara felizes os misericordiosos. Se andamos à procura da santidade que agrada a Deus, neste texto encontramos precisamente uma regra de comportamento com base na qual seremos julgados: ‘Tive fome e destes-me de comer, tive sede e destes-me de beber, era peregrino e recolhestes-me, estava nu e destes-me o que vestir, adoeci e visitastes-me, estive na prisão e fostes ter comigo» (25, 35-36)’. É tudo que precisamos.
Nossa consciência deve ser o motor que nos faz sair da inércia e entrar na dinâmica do reino. Ser melhor do que ontem, para amar melhor a Deus no divino e na sua criação, onde o vemos nos irmãos e nas coisas criadas. Nossa catequese deve ser feita com atos de virtudes evangélicas. Muito mais do que palavras, atos de testemunho do amor que nos impulsionam para o céu. Nessa estrada, mais ou menos longa, todos somos convidados a nos mantermos aquecidos e firmes. Entrar na estrada é entrar na realização do Reino de Deus, até que ele nos chame de volta. Que o bom mestre nos ajude a fazer coro com São Paulo: “Combati o bom combate, terminei a minha corrida, conservei a fé. Agora só me resta a coroa da justiça que o Senhor, justo Juiz, me entregará naquele Dia; e não somente para mim, mas para todos os que tiverem esperado com amor a sua manifestação.” (2 Tm 4, 7-8)