Amanhã, 8 de dezembro, enquanto sinos repicam em igrejas pelo mundo todo celebrando a Imaculada Conceição de Maria, precisamos fazer ecoar também um clamor urgente: o reconhecimento do valor inviolável de cada mulher que caminha entre nós. Não é coincidência que justamente nesta semana, às vésperas desta data sagrada para os católicos, tenhamos sido confrontados com mais notícias da violência brutal contra mulheres. É como se a escuridão se intensificasse justamente quando nos aproximamos da luz. Maria, a Mulher por excelência venerada pelos católicos, não foi escolhida por acaso para carregar o divino. Foi escolhida por sua força, sua coragem inabalável, sua capacidade de dizer “sim” quando o mundo inteiro poderia destruí-la por isso. Foi escolhida porque era completa, plena, imaculada, palavra que não significa apenas “sem mancha”, mas também íntegra, intocável em sua dignidade, soberana sobre si mesma.
Quantas Marias caminham hoje em nossas ruas? Quantas mulheres que carregam o mundo em seus ventres, suas mentes e seus braços? Quantas que constroem, curam, ensinam, lideram, amam e sustentam a própria estrutura de nossa civilização? E quantas ainda têm sua dignidade violada por homens que se perderam no tempo, presos em cavernas mentais onde acreditam que força bruta é sinônimo de poder, onde confundem posse com amor? Estamos em pleno século XXI. Temos computadores que cabem em nossos bolsos, vacinas que salvam milhões, carros que dirigem sozinhos. Mas alguns homens ainda vivem como se estivéssemos na Idade das Pedras, quando nem sequer conhecíamos o fogo da consciência. Estes homens não evoluíram. São fósseis vivos de um tempo que a humanidade precisa enterrar definitivamente.
A violência contra a mulher não é apenas um crime; é uma heresia contra a própria vida. Cada mulher agredida é uma Maria sendo apedrejada. Cada mulher silenciada é uma voz profética sendo sufocada. Cada mulher morta é um universo inteiro sendo destruído, porque dentro de cada mulher existe a mesma força criadora que gerou o próprio Cristo. Maria não foi passiva. Maria foi revolucionária. Quando cantou o Magnificat, proclamou que Deus “derruba os poderosos de seus tronos e eleva os humildes”. Que mensagem mais clara poderíamos ter? O poder que oprime será derrubado. A dignidade que é humilhada será elevada.
As mulheres de hoje são médicas que salvam vidas, cientistas que desvendam os mistérios do universo, mães que educam gerações inteiras, empresárias que movem economias, artistas que revelam a beleza escondida do mundo, ativistas que transformam sociedades. São professoras que alfabetizam o futuro, engenheiras que constroem cidades, advogadas que defendem a justiça. São trabalhadoras, sonhadoras, guerreiras incansáveis. E no entanto, precisamos ainda gritar: não toquem nelas! Seus corpos não são territórios de conquista. Suas vontades não são sugestões a serem ignoradas. Suas vidas não são propriedades de ninguém. Elas não existem para servir ao ego frágil de homens inseguros. Elas existem porque são, completas e soberanas em si mesmas.
Amanhã, quando as Ave-Marias forem recitadas em milhões de lares, que cada homem lembre: aquela que veneram teve que fugir no meio da noite para salvar seu filho de um rei cruel, teve que ver seu filho torturado e morto, teve que suportar a incompreensão e o julgamento. E permaneceu forte. Permaneceu íntegra. Permaneceu imaculada em sua dignidade. Que os homens aprendam com José, aquele que escolheu proteger ao invés de acusar, que escolheu amar ao invés de condenar, que entendeu que seu papel não era dominar, mas servir ao amor. As mulheres não precisam de pedestais. Precisam de respeito. Não precisam ser idolatradas. Precisam ser ouvidas. Não precisam ser protegidas como frágeis. Precisam ser respeitadas como fortes. Porque são fortes. Sempre foram.
Nesta semana manchada de sangue inocente, enquanto nos preparamos para celebrar a Imaculada, que cada notícia de violência contra uma mulher nos lembre: profanamos o sagrado cada vez que permitimos que isso continue. E se há algo que a figura de Maria nos ensina é que o sagrado feminino não pode, não deve, e não vai ser destruído. Porque no final, sempre no final, é a mulher que fica de pé aos pés da cruz quando todos fugiram. É a mulher que volta ao túmulo quando a esperança parece morta. É a mulher que testemunha a ressurreição. Que ressuscite em nossos tempos o respeito absoluto pela mulher. Que ressuscite a consciência de que cada mulher é sagrada. Que ressuscite a humanidade nos homens que a perderam.
Amanhã é dia da Imaculada. Mas todos os dias deveriam ser dias de honrar as imaculadas que caminham entre nós, imaculadas em sua dignidade, invioláveis em seu valor, eternas em sua importância para a continuidade da própria vida. Que esta crônica seja uma pequena luz em meio às sombras desta semana. Que o exemplo de Maria inspire não apenas devoção, mas ação concreta em defesa da dignidade de cada mulher.
Feliz Dia da Imaculada Conceição. Feliz dia de celebrar todas as mulheres que fazem deste mundo um lugar que ainda vale a pena viver.

