sábado, 8 de março de 2025

Quaresma: um guia completo para católicos


Você quer viver bem a Quaresma? Este é um guia completo para te ajudar a viver, na prática, este tempo voltado especialmente à conversão.

A Quaresma é um tempo de conversão, marcado pela oração, pelo jejum e pela esmola. Durante quarenta dias, a Igreja nos convida a percorrer o caminho de Cristo no deserto, fazendo penitência, a fim de fortalecer a nossa fé e nos prepararmos para a grande celebração da Páscoa.

Este tempo do ano litúrgico é uma escola espiritual. É o momento oportuno para revisitar as verdades fundamentais da fé, desapegar-se do supérfluo e aprofundar a vida de comunhão com Cristo. Através da liturgia e das práticas quaresmais, somos chamados a viver essa preparação junto com a Igreja, caminhando em direção à ressurreição, que dá sentido a toda a nossa vida cristã.

O que é a Quaresma?

A Quaresma é um tempo litúrgico que nos conduz ao coração do mistério cristão: a Páscoa. Durante quarenta dias, a Igreja nos convida a trilhar um caminho de conversão, marcado pela oração, pelo jejum e pela esmola.

Esse número quarenta não é arbitrário. A duração desse período ecoa, principalmente, os quarenta anos de Israel no deserto e os quarenta dias em que o próprio Cristo jejuou antes de iniciar sua missão pública: “Todos os anos, pelos quarenta dias da Grande Quaresma, a Igreja une-se ao mistério de Jesus no deserto.” (CIC - 540) A Quaresma nos coloca diante dessa dinâmica espiritual: atravessar um tempo de provação para que, purificados, possamos participar da alegria da Páscoa.

Desse modo, mais do que uma tradição, a Quaresma é um chamado à conversão concreta. O jejum nos ensina o desprendimento, a oração nos coloca em sintonia com Deus, e a esmola nos revela que a caridade é a manifestação autêntica da fé. Assim, ao renunciarmos a pequenas vontades e confortos, aprendemos a nos desapegar deste mundo e, pouco a pouco, a morrer para o pecado e ressurgir para uma nova vida, voltando o olhar para o que é essencial: o amor de Deus que nos deu a vida e nos chama à santidade.

Origem e propósito da Quaresma

A Quaresma tem sua origem nos primeiros séculos do Cristianismo, quando a Igreja instituiu um tempo de penitência e preparação para a Páscoa, inspirado nos quarenta dias de jejum de Cristo no deserto. Inicialmente, foi um período de intensa formação para os catecúmenos que seriam batizados na Vigília Pascal, mas logo tornou-se um chamado universal à conversão para todos os fiéis.

Ao longo da história, a Igreja consolidou a Quaresma como um itinerário espiritual em que cada cristão é convidado a voltar-se para Deus com um coração arrependido e disposto à conversão. Por isso, o chamado à conversão é insistentemente repetido nesse tempo como um convite concreto a reorientar a nossa vida segundo os ensinamentos do próprio Cristo, por meio da prática do jejum, da esmola e da oração.

E tudo isso nos prepara para viver o mistério pascal. Se Cristo passou pela cruz para chegar à Ressurreição, também nós devemos morrer para o pecado e ressuscitar para uma vida nova, tornando a Páscoa não apenas uma celebração, mas uma transformação real em nossa vida.

Quaresma no calendário litúrgico

A Quaresma ocupa um lugar central no calendário litúrgico da Igreja, inserindo-se no ciclo pascal como um tempo de preparação intensa para a celebração da ressurreição de Cristo. Com duração de quarenta dias, ela se inicia na Quarta-feira de Cinzas e se estende até a Missa da Ceia do Senhor, na Quinta-feira Santa, quando tem início o Tríduo Pascal.

Durante esse período, os fiéis são chamados a uma vivência mais profunda da fé, através da penitência, da oração e da caridade. Os cinco domingos da Quaresma marcam a caminhada progressiva rumo à Páscoa, conduzindo os cristãos a uma maior intimidade com Deus.

Quando começa a Quaresma em 2025?

Em 2025, a Quaresma terá início no dia 5 de março, com a celebração Quarta-feira de Cinzas.

A Quarta-feira de Cinzas é um dia de jejum e abstinência, quando os fiéis recebem a imposição das cinzas como sinal de arrependimento e conversão. Este dia marca o início deste tempo que a Igreja orienta os fiéis a se prepararem espiritualmente para viver plenamente o mistério da Paixão, Morte e Ressurreição do Senhor.

Quando termina a Quaresma em 2025?

Em 2025, a Quaresma vai até o dia 17 de abril, antes a celebração da Quinta-feira Santa.

Algumas pessoas podem ter dúvida quanto ao término do período quaresmal, uma vez que, à última semana (que inicia com o Domingo de Ramos), chamamos “Semana Santa”. Entende-se, no entanto, que a Quaresma termina logo antes da Missa da Ceia do Senhor, quando a Igreja dá início ao Tríduo Pascal.

O que a Bíblia diz sobre a Quaresma?

A Bíblia nos apresenta o simbolismo do número 40 como um tempo de provação e purificação: Jesus se retira ao deserto para jejuar e rezar antes de iniciar sua missão. Na Quarta-feira de Cinzas, somos, portanto, lembrados de nossa fragilidade e do nosso chamado à conversão.

Esse itinerário espiritual, vivido ano após ano, convida-nos a percorrer o mesmo caminho trilhado pelos fiéis desde os tempos bíblicos: um caminho de penitência, arrependimento e renovação.

O número 40 na Bíblia

O número 40 aparece repetidamente na Sagrada Escritura como um tempo de preparação e prova. Alguns exemplos são:

Durante 40 dias e 40 noites, as águas do dilúvio cobriram a terra, enquanto Noé e sua família aguardavam a renovação do mundo (Gn 7,12);

O povo de Israel peregrinou 40 anos no deserto, sendo purificado antes de entrar na Terra Prometida (Nm 14,33);

Moisés jejuou 40 dias no Sinai antes de receber a Lei (Ex 34,28);

Elias caminhou esse mesmo período até o Horebe, onde encontrou Deus (1Rs 19,8).

Por fim, no Novo Testamento, Cristo, o maior modelo, reafirma esse simbolismo ao jejuar 40 dias no deserto, preparando-se para a missão de redenção da humanidade.

Jesus no deserto: modelo para os cristãos

Antes de iniciar sua vida pública, Jesus foi conduzido pelo Espírito Santo ao deserto, onde jejuou por 40 dias e sofreu as tentações do demônio (Mt 4,1-11). No entanto, Cristo resistiu, ensinando que a verdadeira força não está nos bens deste mundo, mas na fidelidade a Deus. Seu tempo no deserto simboliza para nós a necessidade de purificação e fortalecimento espiritual, mostrando que a luta contra o pecado exige vigilância, renúncia e uma confiança inabalável no Pai.

A Quaresma é, para a Igreja, esse tempo de deserto espiritual. Não se trata apenas de abstinências exteriores, mas de um combate interior contra tudo o que nos afasta de Deus. Assim como Cristo fortalece seu espírito pela oração e pelo jejum, os fiéis são chamados a intensificar sua vida de oração, a renunciar ao pecado e a praticar a caridade de maneira concreta. O deserto não é um lugar de abandono, mas de encontro com Deus. Quem vive bem a Quaresma aprende a depender menos de si e mais da graça divina, preparando-se para a alegria da Páscoa, que é a vitória definitiva sobre o mal.

O significado da Quarta-feira de Cinzas

A Quarta-feira de Cinzas marca o início da Quaresma com um rito profundamente simbólico: a imposição das cinzas sobre a cabeça dos fiéis. Esse gesto remonta à tradição bíblica, em que as cinzas eram sinal de tristeza, arrependimento e humildade diante de Deus (Jl 2,12-13).

Ao receber as cinzas, ouvimos as palavras: “Lembra-te que és pó e ao pó voltarás” (Gn 3,19) ou “Convertei-vos e crede no Evangelho” (Mc 1,15), recordando-nos da brevidade da vida e do chamado à conversão. Neste dia, entramos, mais profundamente, no espírito quaresmal, rumo a um caminho sincero de conversão e união a Nosso Senhor.

Os três pilares da Quaresma: Oração, Jejum e Esmola

A Igreja nos ensina que a Quaresma não é apenas um tempo de reflexão, mas um período de ação concreta na vida espiritual. Para isso, ela propõe três práticas fundamentais: oração, jejum e esmola. Esses 3 pilares da Quaresma são o caminho para uma conversão mais profunda, ajudando-nos a voltar o coração para Deus e para os irmãos.

A penitência interior do cristão pode ter expressões muito variadas. A Escritura e os Padres insistem sobretudo em três formas: o jejum, a oração e a esmola que exprimem a conversão, em relação a si mesmo, a Deus e aos outros. (CIC 1434)

Pela oração, entramos em comunhão mais íntima com o Senhor; pelo jejum, aprendemos a dominar paixões e direcionar nossa vontade para o que é fundamental e, pela esmola, exercitamos o amor ao próximo, rompendo com o egoísmo. Seguindo esse tripé espiritual, o cristão trilha um caminho de fortalecimento interior, preparando-se para celebrar a Páscoa com um coração transformado.

Oração: aprofundamento na intimidade com Deus

Na Quaresma, somos chamados a intensificar nossa vida de oração, pois é nela que encontramos força para perseverar no caminho da conversão. Cristo, em sua vida terrena, retirava-se frequentemente para rezar, ensinando-nos que a oração é o fundamento de toda vida espiritual.

A oração, saibamo-lo ou não, é o encontro da sede de Deus com a nossa. Deus tem sede de que nós tenhamos sede d’Ele. (CIC 2560)

O tempo quaresmal muito é propício para irmos em busca dessa fonte que é Deus e aprofundarmos a nossa relação com Ele; não apenas pedindo graças, mas, especialmente, ouvindo sua voz e conformando nosso coração ao d’Ele. Para isso, o Santo Rosário, a Via-Sacra, a meditação da Palavra de Deus e a participação mais frequente na Eucaristia são meios concretos para crescer na oração durante a Quaresma. A oração sincera transforma a alma, iluminando as trevas do pecado e conduzindo-nos a uma verdadeira renovação interior.

Jejum: renúncia e disciplina espiritual

O jejum quaresmal não é apenas uma privação alimentar, mas um exercício espiritual que nos ensina a renunciar a nós mesmos para dar espaço a Deus. No deserto, Jesus jejuou durante quarenta dias, mostrando que a disciplina do corpo fortalece a alma na luta contra as tentações. Ao privar-nos de certos alimentos ou hábitos, não o fazemos por mero sacrifício, mas para lembrar que “nem só de pão vive o homem, mas de toda palavra que sai da boca de Deus” (Mt 4,4).

O jejum nos ensina a ter domínio sobre nossos desejos e não sermos escravos das satisfações imediatas. Além da restrição alimentar, podemos também nos abster de distrações, de redes sociais ou qualquer hábito que possa nos afastar de uma vida equilibrada. Lembrando que o verdadeiro jejum não é um fim em si mesmo, mas uma via para purificar o coração, tornando-nos mais sensíveis às necessidades do próximo e fortalecendo nossa vida espiritual.

Esmola: caridade e partilha com os necessitados

A esmola é uma manifestação concreta de conversão, pois nos faz sair de nós mesmos e enxergar a necessidade do outro. Durante a Quaresma, a Igreja nos convida a ser mais generosos com os pobres e com aqueles que sofrem, pois a verdadeira penitência não se limita a sacrifícios individuais, mas deve transbordar em amor ao próximo. Jesus nos ensina que tudo o que fazemos ao menor de nossos irmãos, é a Ele que fazemos (Mt 25,40).

Sendo assim, a esmola não se resume a dar dinheiro, mas envolve tempo, atenção e gestos de misericórdia. Visitar os doentes, ajudar um necessitado, praticar o perdão e ouvir com paciência também são formas de esmola que agradam a Deus. Quando compartilhamos o que temos – seja um recurso material, seja nossa atenção – de bom coração, estamos imitando Cristo, que se entrega por nós.

A cor litúrgica e tradições da Quaresma

A liturgia da Igreja expressa, em cada detalhe, a espiritualidade de cada tempo litúrgico. Na Quaresma, a cor roxa predomina, revelando o chamado à penitência e ao recolhimento. Esse tom, associado à conversão e à preparação, veste os paramentos dos sacerdotes e os tecidos que adornam o altar, convidando os fiéis a uma disposição interior de humildade e contrição.

Além da cor litúrgica, há outras tradições que marcam esse período, uma delas é a ausência do cântico do “Glória” e do “Aleluia” nas celebrações eucarísticas. O silêncio dessas aclamações jubilosas sublinha o caráter penitencial da Quaresma, criando um anseio espiritual pela Páscoa, quando o “Aleluia” ressoará com renovada alegria.

Outro elemento característico é a sobriedade na ornamentação das igrejas. O esplendor das flores e decorações cede lugar à simplicidade, favorecendo um ambiente de introspecção. Esse despojamento exterior é um convite ao despojamento interior, levando os fiéis a buscar a beleza dentro de si, numa alma purificada.

Por fim, a tradição também costuma cobrir imagens e crucifixos com um véu roxo. Essa prática nos convida a uma reflexão mais profunda sobre o mistério da cruz, aumentando a expectativa pela revelação plena de Cristo no Domingo da Ressurreição.

Tudo na liturgia quaresmal é pedagogia espiritual: por meio dos sentidos, a Igreja nos educa a interiorizar o mistério pascal, preparando-nos para acolher, com um coração renovado, a vitória de Cristo sobre o pecado e a morte.

A celebração dos domingos da Quaresma

A Quaresma é um tempo de reflexão profunda, marcado por penitência, oração e jejum. A Igreja, mãe e mestra, a cada domingo deste tempo nos conduz a um aspecto essencial da caminhada cristã, a fim de nos preparar para a Páscoa. Em 2025, estamos no Ano C, com o foco nas leituras do Evangelho de São Lucas.

Primeiro Domingo da Quaresma

As leituras deste domingo destacam a luta contra a tentação e o convite à conversão.

Ano A: Gênesis 2,7-9; 3,1-7; Romanos 5,12-19; Mateus 4,1-11

Ano B: Gênesis 9,8-15; 1 Pedro 3,18-22; Marcos 1,12-15

Ano C: Deuteronômio 26,4-10; Romanos 10,8-13; Lucas 4,1-13

Neste primeiro domingo de Quaresma, as leituras falam sobre a tentação de Jesus no deserto, ecoando a experiência de Adão e Eva no paraíso. A ênfase está na luta espiritual e no domínio de si mesmo, quando somos chamados a resistir às tentações e buscar uma vida de fidelidade a Deus.

A Quaresma começa com um forte apelo à conversão e ao discernimento interior, seguindo o exemplo de Cristo, que venceu a tentação.

Segundo Domingo da Quaresma

As leituras do segundo domingo nos convidam a olhar para a transfiguração de Cristo e reforçam a importância da fé na transformação espiritual.

Ano A: Gênesis 12,1-4; 2 Timóteo 1,8-10; Mateus 17,1-9

Ano B: Gênesis 22,1-2.9-13.15-18; 2 Coríntios 4,3-6; Marcos 9,2-10

Ano C: Gênesis 15,5-12.17-18; Filipenses 3,17–4,1; Lucas 9,28b-36

O segundo domingo nos apresenta a Transfiguração de Jesus, um momento de revelação da Sua glória divina. A liturgia nos convida a refletir sobre o caminho de transformação que Cristo propõe a cada um de nós. A ênfase está na esperança e na luz divina, que nos orienta para uma vida nova.

Como os discípulos no Monte Tabor, somos chamados a fixar nosso olhar em Cristo e ouvir a sua voz. A fé nos convida a confiar que somente Ele pode nos transformar por sua graça. Além disso, a Transfiguração, ao revelar a glória do Senhor, recorda-nos que a cruz não é o fim, mas o caminho para a ressurreição.

Terceiro Domingo da Quaresma

As leituras deste domingo nos levam a refletir sobre a água viva, que é o próprio Cristo, e o arrependimento genuíno.

Ano A: Êxodo 17,3-7; Romanos 5,1-2.5-8; João 4,5-42

Ano B: 1Coríntios 10,1-4; Êxodo 17,3-7; João 2,13-25

Ano C: Êxodo 3,1-8.13-15; 1 Coríntios 10,1-12; Lucas 13,1-9

Neste domingo, o Evangelho fala sobre o encontro de Jesus com a mulher samaritana, que vem à fonte para saciar sua sede. O foco está na purificação e no arrependimento, convidando-nos a beber da “água viva” oferecida por Cristo. Somos chamados a reconhecer nossa sede espiritual e a abrir o coração para que a graça de Deus nos transforme profundamente, dando-nos uma nova vida.

Quarto Domingo da Quaresma

As leituras deste domingo nos falam sobre a cura espiritual e o convite à reflexão profunda sobre a misericórdia de Deus.

Ano A: 1Samuel 16,1-13; Efésios 5,8-14; João 9,1-41

Ano B: 2 Crônicas 36,14-23; Efésios 2,4-10; João 3,14-21

Ano C: Josué 5,9a.10-12; 2Coríntios 5,17-21; Lucas 15,1-3.11-32

O Evangelho deste domingo relata a cura do cego de nascença, que simboliza a luz espiritual que Cristo oferece a todos. Ele nos chama a sair das trevas do pecado e a viver na luz da Sua verdade. É forte o tema do arrependimento e da reconciliação, convidando-nos a voltar ao Pai com um coração contrito, como o filho pródigo que retorna ao abraço do pai misericordioso.

Quinto Domingo da Quaresma

As leituras do quinto domingo nos falam sobre a ressurreição e a vida eterna em Cristo, reforçando a esperança de que, com Cristo, a morte não tem a última palavra.

Ano A: Ezequiel 37,12-14; Romanos 8,8-11; João 11,1-45

Ano B: Jeremias 31,31-34; Hebreus 5,7-9; João 12,20-33

Ano C: Isaías 43,16-21; Filipenses 3,8-14; João 8,1-11

No quinto domingo, a liturgia nos apresenta a ressurreição de Lázaro, um sinal claro da vitória de Cristo sobre a morte. O tema central é a vida nova que Cristo oferece, chamando-nos a renovar a esperança na ressurreição e no poder de Deus para transformar nossas vidas. Somos levados a olhar para a promessa da Páscoa: Cristo que vence a morte e nos oferece a vida eterna.

A Quaresma e a Igreja ao longo dos séculos

A Quaresma, como a vivemos hoje, é fruto de um desenvolvimento da vida litúrgica da Igreja ao longo dos séculos. Desde os primeiros tempos do cristianismo, esse período foi sendo moldado pela Tradição, aprofundando sua espiritualidade e estrutura.

Embora sua forma tenha passado por ajustes, a essência é inalterada: um tempo de preparação intensa para a Páscoa, marcado pelo jejum, pela oração e pela caridade.

A Quaresma nas primeiras comunidades cristãs

Nos primeiros séculos, a Quaresma ainda não possuía uma estrutura uniforme, mas já se manifestava como um período de penitência e conversão. Sua origem está ligada à preparação dos catecúmenos para o Batismo, que era celebrado na Vigília Pascal. Durante esse tempo, aqueles que desejavam ingressar na Igreja passavam por um intenso período de jejum, oração e ensinamentos doutrinários, acompanhados pelos fiéis, que também se dedicavam à penitência.

O jejum era uma prática central. Em algumas regiões, inicialmente, jejuava-se apenas nos dois ou três dias anteriores à Páscoa; em outras, já se observava um período mais longo de preparação. Por volta do século IV, sob a influência dos Padres da Igreja e dos concílios locais, o tempo de quarenta dias começou a ser adotado, inspirado no exemplo bíblico dos quarenta dias de jejum de Cristo no deserto.

O desenvolvimento litúrgico da Quaresma

Com o passar dos séculos, a estrutura litúrgica de Quaresma foi se consolidando. No século IV, a prática do jejum de quarenta dias já estava amplamente difundida no Oriente e no Ocidente cristão. Foi nesse período que se passou a Quarta-feira de Cinzas como início oficial da Quaresma, marcando a entrada solene nesse tempo de penitência.

Durante a Idade Média, as regras do jejum eram mais rigorosas, os fiéis deveriam se abster de carne, laticínios e ovos, fazendo apenas uma refeição por dia após o pôr do sol. Aos poucos, isso também foi mudando até que fosse introduzida a abstinência de carne como uma obrigação principal.

Outro desenvolvimento importante foi a progressiva organização do ciclo litúrgico quaresmal. Os textos das leituras bíblicas foram ajustados para enfatizar o chamado à conversão, e práticas como a Via Sacra e o canto do “Stabat Mater” se difundiram na piedade popular. No século XVI, com o Concílio de Trento, a estrutura de Quaresma foi reafirmada, consolidando a sua importância na vida cristã.

Por fim, o Concílio Vaticano II manteve a centralidade de Quaresma, enfatizando especialmente seu caráter espiritual aliado às prescrições externas. A Igreja reforçou o valor da conversão interior, incentivando os fiéis a viverem esse tempo não apenas como um cumprimento de regras, mas como um verdadeiro caminho de renovação e configuração a Cristo. Assim, a Quaresma continua, através dos séculos, a ser um chamado vivo à santidade.

A Quaresma e a vida espiritual do cristão

A Quaresma não é apenas um período no calendário litúrgico; ela é, sobretudo, um chamado pessoal à conversão. A Igreja nos propõe esses quarenta dias como um tempo favorável para examinarmos nossa vida espiritual, identificarmos onde precisamos crescer e nos propormos uma renovação sincera. Esse processo exige humildade para considerar nossas fraquezas, pedir perdão e nos abrirmos à graça transformadora de Deus.

Para isso, a Confissão torna-se essencial. Através do Sacramento da Reconciliação, recebemos o perdão dos pecados e a força para recomeçar. A Eucaristia, por sua vez, nos une mais intimamente a Cristo, alimentando-nos para a caminhada espiritual. Por isso, a Quaresma é um tempo ainda mais propício para aumentar nossa frequência na Missa, praticar a Adoração Eucarística e intensificar nossa oração pessoal.

Além disso, essa conversão deve se manifestar exteriormente em obras concretas. A Igreja nos convida a viver as obras de misericórdia, tanto espirituais (como instruir, aconselhar e perdoar) quanto corporais (como alimentar os famintos e visitar os enfermos). Pequenos atos diários de caridade são um reflexo do amor de Cristo em nós.

Por fim, a penitência quaresmal nos ensina a crescer na paciência e no domínio próprio. Ao renunciarmos a certos prazeres e realizarmos pequenos sacrifícios, aprendemos a ordenar nossos desejos e fortalecer nossa vontade. Mais do que gestos externos, as mortificações devem ser oferecidas como um meio de santificação, unindo-nos ao sacrifício redentor de Cristo. Assim, a Quaresma torna-se um verdadeiro itinerário de transformação espiritual, preparando-nos para celebrar a Páscoa com um coração renovado.

Como viver bem a Quaresma?

A Quaresma é um caminho para a conversão por meio da oração, do jejum e da esmola, mas viver bem este tempo exige decisão e compromisso. Se essas práticas não são habituais, será necessário um esforço para inseri-las na rotina, a fim de realmente viver bem a Quaresma. A seguir, veja algumas dicas de como implementar essas práticas no seu dia.

1. Organize sua rotina de oração

Estabeleça horários fixos para rezar, de acordo com a sua realidade. Pode ser o Terço diário, a leitura do Evangelho ou a meditação com textos espirituais, como as Meditações para a Quaresma com Santo Afonso de Ligório. E, se possível, participe da Santa Missa com mais frequência e busque o Sacramento da Confissão.

2. Escolha um jejum significativo

Além da abstinência de carne nas sextas-feiras, adote um sacrifício pessoal, por exemplo:

reduzir distrações, como redes sociais;

evitar falar muito, se não é necessário, praticar mais o silêncio interior;

abster-se de algum alimento do qual gosta muito, comer mais do que gosta menos;

terminar as refeições sem estar totalmente saciado;

não reclamar das contrariedades do dia.

Essas são apenas algumas ideias. O jejum deve ser um exercício de domínio próprio, que abra espaço para Deus e te leve a uma conversão, portanto é importante escolher algo que realmente lhe custe e provoque uma transformação interior genuína.

3. Pratique a esmola com generosidade

Não apenas bens materiais, mas também seu tempo e atenção. Pequenos gestos de caridade – uma visita a alguém solitário, paciência no dia a dia, ajuda a quem precisa – são formas concretas de viver a esmola quaresmal.

Livros para ler na Quaresma

Alguns hábitos, como o da leitura, são muito úteis para nos auxiliar nessa caminhada de conversão e aprofundamento espiritual. Obras que nos levam à meditação sobre a Paixão de Cristo e sobre o fim de nossa vida terrena são grandes auxílios para viver esse tempo com mais profundidade e devoção.

A Minha Biblioteca Católica publicou títulos que são verdadeiras orientações espirituais para esse período:

Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo

Santo Afonso de Ligório nos conduz, por meio deste livro, a uma profunda contemplação dos sofrimentos de Cristo, revelando o imenso amor de Deus por nós. Ideal para meditações diárias durante a Quaresma.

Preparação para a Morte

Também de Santo Afonso, este livro revela-nos a transitoriedade da vida e a necessidade de estarmos sempre prontos para o encontro com Deus. Um chamado à conversão sincera.

Vida e Paixão do Cordeiro de Deus

Escrito por uma grande mística, Anna Catarina Emmerich, este livro nos conduz a uma meditação profunda sobre a vida e os últimos dias da vida terrena de Cristo, convidando-nos a uma identificação mais profunda com o seu amor sacrificial.

A prática do amor a Jesus Cristo

Neste outro clássico da espiritualidade, Santo Afonso ensina que a perfeição cristã consiste em amar a Jesus de todo o coração. Um livro que ajuda a transformar a fé na vida concreta.

Esses são apenas alguns dos títulos que você pode escolher para uma leitura espiritual durante este tempo. Conheça a loja exclusiva para membros do clube e garanta os seus exemplares.

Certamente, dedicar-se a uma dessas obras nutrirá sua alma, ajudando-o a entrar mais profundamente no mistério da Paixão de Cristo, a colher ensinamentos práticos para a vida cotidiana e, acima de tudo, aproximando seu coração do coração de Jesus.

ÚLTIMAS NOTÍCIAS