segunda-feira, 2 de setembro de 2024

O humanismo do Papa Francisco

Por Dom João S Cardoso

O Papa Francisco, ao insistir, na Laudato Sì (LS), no valor intrínseco de cada realidade, humana ou não, dentro da criação, supera o antropocentrismo característico do Humanismo do Iluminismo. Diferentemente do humanismo moderno, que colocava o ser humano no centro absoluto do universo, o humanismo do Papa Francisco afirma que “tudo está estreitamente interligado no mundo” (LS, n. 16). Com isso, o Papa reconhece a interdependência entre todas as criaturas e promove uma visão mais integrada e responsável da nossa presença no mundo.

“Tudo está interligado. Se o ser humano se declara autônomo da realidade e se constitui como dominador absoluto, desmorona-se a própria base da sua existência, porque «em vez de realizar o seu papel de colaborador de Deus na obra da criação, o homem substitui-se a Deus, e deste modo acaba por provocar a revolta da natureza»” (LS, 117). Ao reconhecer a interdependência entre o ser humano e a criação, o Papa Francisco aponta para um Eco-humanismo, que lhe permite denunciar as consequências de um antropocentrismo desenfreado, que desrespeita os limites ecológicos e leva à exploração irresponsável dos recursos naturais.

Essa visão permite-lhe criticar o paradigma tecnocrático que vê a natureza apenas como um recurso a ser explorado e insiste na necessidade de uma “conversão ecológica” que reconheça o valor próprio de cada ser e a interconexão de todos os elementos da criação (LS n. 16, 91, 117, 138). “Tudo está interligado, e isto nos convida a amadurecer uma espiritualidade da solidariedade global que brota do mistério da Trindade” (LS, 240).

Este novo humanismo é, portanto, um chamado à responsabilidade e a uma espiritualidade baseada em uma nova consciência do nosso papel como cuidadores da criação e como parte de uma comunidade global interconectada. Isso implica uma mudança profunda no modo de vida, nos padrões de consumo e nas relações com o meio ambiente e com os outros. Esse novo estilo de vida austero e solidário, resultado da “conversão ecológica”, é necessário para enfrentar as crises climáticas e sociais, colocando o bem comum acima dos interesses econômicos e tecnológicos, a fim de construir um mundo mais justo, sustentável e humano, onde a economia e a política estejam a serviço da vida e da dignidade de todas as pessoas.

Isso pressupõe uma ecologia integral, que vai além da simples preservação do meio ambiente e se estende ao cuidado com a vida humana em sua totalidade. “Mas, hoje, não podemos deixar de reconhecer que uma verdadeira abordagem ecológica sempre se torna uma abordagem social, que deve integrar a justiça nos debates sobre o meio ambiente, para ouvir tanto o clamor da terra como o clamor dos pobres” (Laudato Si’, 49). Esse é o sentido humano da ecologia, centrado na ideia de que a relação entre o ser humano e o ambiente não pode ser entendida separadamente da relação com os outros seres humanos e com Deus. E nos convida a integrar o cuidado com a criação com o cuidado pelas pessoas, promovendo uma abordagem holística que considera o meio ambiente, a justiça social e o bem-estar humano como aspectos inseparáveis de uma mesma realidade.

Na “Laudate Deum”, Francisco reforça que este humanismo exige uma resposta urgente às crises ecológicas e sociais, enfatizando que o cuidado com o planeta é inseparável do cuidado com a humanidade. Ele critica duramente a cultura do descarte e o consumismo exacerbado, que não apenas degradam o ambiente, mas também desumanizam as relações sociais, criando uma sociedade marcada pela indiferença e pela injustiça. O novo humanismo, assim, propõe uma visão onde o desenvolvimento sustentável e a justiça social caminham juntos, promovendo uma vida digna para todos.



Dom João Santos Cardoso
Arcebispo Metropolitano de Natal

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