domingo, 21 de setembro de 2025

Texto completo da catequese de Leão XIV no Jubileu dos Operadores de Justiça

Papa Leão XIV no Jubileu dos Operadores de Justiça no dia 20 de setembro de 2025. | Crédito: Vatican Media.

O papa Leão XIV se encontrou ontem (20) na praça de São Pedro com milhares de participantes do Jubileu dos Operadores de Justiça. A seguir, o texto completo da mensagem do papa aos peregrinos:

A todos, muito bom dia! Good morning and welcome!

Queridos irmãos e irmãs!

Sinto-me feliz ao acolher-vos por ocasião do Jubileu dedicado a quem, a vários títulos, trabalha no vasto campo da justiça. Saúdo as distintas autoridades presentes, vindas de muitos países, em representação de diversos tribunais, e todos vós que diariamente prestais um serviço necessário à convivência ordeira entre as pessoas, as comunidades e os Estados. Saúdo também outros peregrinos que se juntaram a este Jubileu! O Jubileu torna-nos a todos peregrinos que, ao redescobrir os sinais da esperança que não engana, querem «reencontrar a confiança necessária, tanto na Igreja como na sociedade, no relacionamento interpessoal, nas relações internacionais, na promoção da dignidade de cada pessoa e no respeito pela criação» (Bula de indicação do Jubileu, 25).

Que ótima ocasião para refletir mais de perto sobre a justiça e a sua função, a qual sabemos ser indispensável quer para o desenvolvimento ordenado da sociedade, quer como virtude cardeal que inspira e orienta a consciência de cada homem e mulher. A justiça, com efeito, é chamada a desempenhar uma função superior na convivência humana, não podendo ser reduzida à mera aplicação da lei ou à ação dos juízes, nem limitar-se aos aspetos processuais.

«Amas a justiça e odeias a injustiça» (Sl 45, 8), lembra-nos a expressão bíblica, exortando cada um de nós a fazer o bem e a evitar o mal. E quanta sabedoria contém a máxima “dar a cada um o que é seu”! No entanto, tudo isso não esgota o desejo profundo do justo que está em cada um de nós, aquela sede de justiça que é o principal instrumento para construir o bem comum em qualquer sociedade humana. Na justiça, efetivamente, conjugam-se a dignidade da pessoa, a sua relação com o outro e a dimensão da comunidade feita de convivência, estruturas e regras comuns. Uma circularidade da relação social que coloca no centro o valor de cada ser humano, a preservar através da justiça face a diversas formas de conflito que podem surgir do agir individual, ou da perda do sentido comum que pode envolver também os aparelhos e as estruturas.

A tradição ensina-nos que a justiça é, em primeiro lugar, uma virtude, ou seja, uma atitude firme e estável que guia o nosso procedimento segundo a razão e a fé. [1] A virtude da justiça, em particular, consiste na «constante e firme vontade de dar a Deus e ao próximo o que lhes é devido». [2] Nessa perspetiva, para quem acredita, a justiça dispõe «a respeitar os direitos de cada qual e a estabelecer, nas relações humanas, a harmonia que promove a equidade em relação às pessoas e ao bem comum», [3] objetivo que se torna garante de uma ordem que protege os fracos, aqueles que pedem justiça porque vítimas de opressão, excluídos ou ignorados.

Em muitos episódios evangélicos, a ação humana é avaliada por uma justiça capaz de derrotar o mal da prepotência, como lembra a insistência da viúva que leva o juiz a reencontrar o sentido da justiça (cf. Lc 18, 1-8). Mas também uma justiça superior que paga ao trabalhador da última hora como ao que trabalha o dia inteiro (cf. Mt 20, 1-16); ou aquela que faz da misericórdia a chave de interpretação das relações e leva a perdoar, acolhendo o filho que estava perdido e foi reencontrado (cf. Lc 15, 11-32), ou, mais ainda, a perdoar não sete vezes, mas setenta vezes sete (cf. Mt 18, 21-35). É a força do perdão, própria do mandamento do amor, que surge como elemento constitutivo de uma justiça capaz de conjugar o sobrenatural com o humano.

A justiça evangélica, portanto, não se desvia da justiça humana, mas questiona-a e redesenha-a: leva-a a ir sempre mais além, porque a impulsiona à busca da reconciliação. O mal, na verdade, não deve apenas ser punido, mas reparado, e para isso é necessário um olhar profundo em relação ao bem das pessoas e ao bem comum. Tarefa árdua, mas não impossível para quem, consciente de desempenhar um serviço mais exigente do que outros, se compromete a manter uma conduta de vida irrepreensível.

Como se sabe, a justiça torna-se concreta quando se orienta para os outros, quando a cada um é dado o que lhe é devido, até se alcançar a igualdade em dignidade e oportunidades entre os seres humanos. No entanto, estamos cientes de que a igualdade efetiva não é a igualdade formal perante a lei. Esta igualdade, apesar de ser uma condição indispensável para o exercício correto da justiça, não elimina o facto de existirem discriminações crescentes cujo primeiro efeito é precisamente a falta de acesso à justiça. A verdadeira igualdade, pelo contrário, é a possibilidade dada a todos de realizar as suas aspirações e de ver garantidos os direitos inerentes à própria dignidade por um sistema de valores comuns e partilhados, capazes de inspirar normas e leis nas quais basear o funcionamento das instituições.

Hoje, o que motiva os operadores de justiça é precisamente a busca ou a recuperação dos valores esquecidos na convivência, o cuidar deles e o respeito por eles. Trata-se de um processo útil e necessário, diante do surgimento de comportamentos e estratégias que demonstram desprezo pela vida humana desde o seu início, que negam direitos básicos para a existência pessoal e não respeitam a consciência da qual brotam as liberdades. Precisamente através dos valores que estão na base da vida social, a justiça assume o seu papel central na convivência das pessoas e das comunidades humanas. Como escreveu Santo Agostinho: «A justiça não é tal se não for ao mesmo tempo prudente, forte e temperante» [4]. Isso requer a capacidade de pensar sempre à luz da verdade e da sabedoria, de interpretar a lei com profundidade, indo além da dimensão puramente formal, para captar o sentido íntimo da verdade à qual servimos. Tender para a justiça, portanto, requer poder amá-la como uma realidade que só pode ser alcançada se se conjugar a atenção constante, o desinteresse radical e um discernimento assíduo. Com efeito, quando se exerce a justiça, colocamo-nos ao serviço das pessoas, do povo e do Estado, com uma dedicação completa e constante. A grandeza da justiça não diminui quando é exercida nas pequenas coisas, mas emerge sempre que é aplicada com fidelidade ao direito e ao respeito da pessoa, onde quer que ela se encontre no mundo. [5]

«Felizes os que têm fome e sede de justiça,
porque serão saciados» (Mt 5, 6). Com esta bem-aventurança, o Senhor Jesus quis expressar a tensão espiritual à qual é necessário estar abertos, não só para obter uma verdadeira justiça, mas sobretudo para a procurar por parte daqueles que a devem aplicar nas diferentes situações históricas. Ter «fome e sede» de justiça equivale a estar consciente de que ela exige o esforço pessoal de interpretar a lei do modo mais humano possível, mas, sobretudo, pede que se procure uma «saciedade» que só pode ser satisfeita numa justiça maior, que transcenda as situações particulares.

Queridos amigos, o Jubileu convida também a refletir sobre um aspeto da justiça que muitas vezes não é suficientemente focado: a realidade de tantos países e povos que têm «fome e sede de justiça», porque as suas condições de vida são tão injustas e desumanas que se revelam inaceitáveis. Ao panorama internacional atual deveriam, portanto, aplicar-se estas sentenças perenemente válidas: «Sem a justiça não se pode administrar o Estado; é impossível que haja direito num Estado onde não há verdadeira justiça. O ato que se realiza segundo o direito realiza-se certamente segundo a justiça, e é impossível que se realize segundo o direito o ato que se realiza contra a justiça [...] O Estado, no qual não há justiça, não é um Estado. A justiça é, com efeito, a virtude que distribui a cada um o que é seu. Portanto, não é justiça do homem aquela que retira o próprio homem ao Deus verdadeiro». [6] As palavras exigentes de Santo Agostinho inspiram cada um de nós a exercer, sempre e da melhor maneira, a justiça ao serviço do povo, com o olhar voltado para Deus, de modo a respeitar plenamente a justiça, o direito e a dignidade das pessoas.

Com este desejo, vos agradeço e abençoo de coração cada um de vós, as vossas famílias e o vosso trabalho.

Fonte da informação

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