Na celebração da Eucaristia, lugar do evento da anamnese, memorial do sacrifício redentor de Jesus Cristo, a Igreja fixa o seu olhar e a sua atenção sobre duas mesas: a mesa da Palavra, chamada de “ambão” e a mesa da Eucaristia, chamado de “altar”. São também as partes da Liturgia: Liturgia da Palavra, Liturgia Eucarística.
Sendo “casa da Palavra”, a Igreja é constantemente exortada a que viva da Palavra de Deus. Já o Concilio Vaticano II, no seu primeiro documento, a Constituição sobre a Sagada Liturgia, Sacrosanctum Concilium (promulgada em 4 de dezembro de 1963), afirmava a enorme importância da Sagrada Escritura na celebração da Liturgia (cf. CONCÍLIO VATICANO II. Constituição sobre a Liturgia Sacrosanctum Concilium, n. 24) e reconhecia que ela, a Igreja, se alimenta da Palavra.
O Papa Francisco, na homilia do 3º Domingo do Tempo Comum, 26 de janeiro passado, afirmava a importância da Sagrada Escritura na vida de fé e exortava a todos para que sintam uma familiaridade com a Palavra: “Toda a Bíblia faz memória de Cristo e da sua obra, e o Espírito atualiza-a na nossa vida e na história. Quando nós lemos, rezamos e estudamos as Escrituras, não recebemos apenas informações sobre Deus, mas acolhemos o Espírito que nos recorda tudo o que Jesus disse e fez (cf. Jo 14, 26).
Assim, o nosso coração, inflamado pela fé, aguarda na esperança a vinda de Deus. Irmãos, irmãs, temos de nos habituar mais à leitura das Escrituras. Gosto de recomendar a cada um que tenha um pequeno Evangelho, um pequeno Novo Testamento de bolso, e que o leve na bolsa, que o leve sempre consigo, que o pegue durante o dia e o leia. Uma passagem, duas passagens... E assim, durante o dia, há esse contato com o Senhor. Um Evangelho pequenino é suficiente” (FRANCISCO. Homilia da Santa Missa do Terceiro Domingo do Tempo Comum. Domingo da Palavra de Deus e Jubileu do mundo da Comunicação, 26 de janeiro de 2025)
Após recebermos o perdão de Deus e cantarmos o Hino de Louvor, estamos prontos a fixar nosso olhar e nossos ouvidos para a mesa da Palavra. Sim, primeiro Deus nos fala. É o movimento inicial, movimento “descendente”. Quando acontece a Liturgia da Palavra, estamos revivendo a dinâmica da Revelação: Deus nos fala. O Papa emérito Bento XVI afirmou isso na Exortação apostólica pós-sinodal Verbm Domini: “Considerando a Igreja como ‘casa da Palavra’, deve-se antes de tudo dar atenção à Liturgia sagrada. Esta constitui, efetivamente, o âmbito privilegiado onde Deus nos fala no momento presente da nossa vida: fala hoje ao seu povo, que escuta e responde (BENTO XVI. Exortação Apostólica Pós-sinodal Verbum Domini, 52).
Toda a Liturgia da Palavra se desenvolve daquela mesa que é o ambão, dali Deus nos fala, da primeira Leitura ao Evangelho, passando pelos Salmos, oração da Igreja primitiva e nossa oração. Mas, a dinâmica se conclui com o outro movimento, agora “ascendente”, nós falamos a Deus. Sim, a mesa da Palavra nos inclui na dinâmica divina. A Liturgia da Palavra s conclui com a “Oração da Assembleia”. Ela é como o elo com a Liturgia Eucarística, pois exprime com algumas das intenções, sejam universais, sejam particulares, pelas quais deve ser oferecido o sacrifício. Dela já se disse que é comparada a “uma pedra preciosa que tinha sido perdida e que agora tinha sido encontrada em todo o seu esplendor” (A. Bugnini).
Deus não fala para as pedras, para as paredes; Deus fala para nós: “Em virtude desta revelação, Deus invisível (cf. Cl 1,15; 1 Tim. 1,17), na riqueza do seu amor fala aos homens como a amigos (cf. Ex 33, 11; Jo 15,14-15) e convive com eles (cfr. Br 3,38), para os convidar e admitir à comunhão com Ele” (CONCÍLIO VATICANO II. Constituição dogmática sobre a Palavra de Deus, Dei Verbum, n. 2). Deus nos fala como a amigos. Como devemos dar importância a esse momento! A participação na Eucaristia não pode ser um momento entre tantos outros. Não vamos para cumprir uma obrigação. Vamos escutar Deus. Não existe consideração mais perfeita sobre nós: existimos para a escuta da Revelação, somos ouvintes da Palavra (Karl Rahner).